Animais Fantásticos

O papel do diretor em um filme como Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald

Escrito por Igor Moretto

O papel de um diretor em um filme pode ser uma questão muito confusa para quem não conhece a indústria cinematográfica de perto. Ora, até mesmo depois da minha graduação em Cinema não acho que possa dizer com certeza que entendo como funcionam os bastidores de um filme de dimensões equiparáveis às dos filmes de “Harry Potter” e “Animais Fantásticos”.

Por que percebemos tanta diferença entre filmes como Harry Potter e a Câmara Secreta e Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban, sendo que praticamente toda a equipe criativa se manteve, com exceção de alguns membros, entre eles o diretor?

Vou tentar explicar o básico do que entendo sobre o papel de um diretor nos diversos processos pelos quais um filme de dimensão tão grande quanto os das franquias distribuídas pela Warner Bros. passa. Mas mesmo assim, muito do que eu vou explicar aqui não está escrito em pedra e, quanto mais diferente os métodos de um diretor, mais diferente será o processo.

Pré-produção

A pré-produção de um filme é o período mais longo de sua concepção. É aqui que o roteiro é escrito, lido, interpretado, e logisticamente e artisticamente projetado para que seja acomodado às filmagens de acordo com o dinheiro disponível, intenções do estúdio, dos produtores e do diretor. É onde a criatividade colaborativa começa e onde o roteiro recebe as primeiras edições.

Nesta etapa, para que tudo faça o mínimo de sentido visual, o diretor supervisiona e dirige os dois principais departamentos artísticos: o de fotografia, encabeçado em “Animais Fantásticos” por Philippe Rousselot, e o de arte (neste caso chamado de production design), encabeçado por Stuart Craig. Os três decidem as composições e o enquadramento de cada plano. Esse processo se chama decupagem.

Foto de bastidores. David Yates observa um cenário e Philippe Rousselot conversa, com uma lente nas mãos.

O diretor de fotografia ajuda a decidir qual lente, qual tipo de iluminação e quais instrumentos utilizar, enquanto o designer de produção decide o que será iluminado e fotografado, se será necessário utilizar efeitos visuais, o que precisará ser confeccionado pelos departamentos e etc..

Foto de David Yates atrás de uma câmera no cenário da casa do Nicolau Flamel. Ele sorri e tem os braços cruzados.

David Yates nos bastidores de Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald.

Além de trabalhar em conjunto com os dois principais departamentos citados acima, o diretor também colabora com roteiristas e produtores. Decide-se o calendário de filmagens e conclui-se o primeiro esboço do roteiro de filmagens (shooting script). Com o diretor de elenco, é aqui também que os atores são escolhidos, e entram artistas como a figurinista Colleen Atwood, o diretor de arte Martin Foley e as equipes de efeitos visuais, som, maquiagem, etc..

O modo de lidar com a produção a partir daqui e, principalmente nos próximos passos, varia de diretor para diretor. Alguns diretores praticamente imprimem e laminam suas decisões meticulosamente pensadas, e outros simplesmente “deixam rolar”, ao ponto em que algumas produções sequer têm diálogos em seus roteiros, apenas contexto e local. Essas cenas serão repensadas durante o processo e poderão ditar mudanças no decorrer das filmagens. Eu diria que no caso de “Animais Fantásticos”, existe um meio termo entre esses dois extremos.

Mas vamos filmar?

Filmagens

No período de filmagem, o diretor deve certificar-se que tudo o que foi planejado está acontecendo como o esperado, desde como os atores interpretam as falas, onde eles estão posicionados, os movimentos que devem fazer, se os movimentos não extrapolam o quadro, se os figurantes estão de acordo com o esperado, e se qualquer dessas coisas precisam de ajustes.

O diretor deixa claro para os atores e a equipe como a cena em questão será visualizada e interpretada pelo público, e qual sua carga emocional. Ele pode tanto utilizar rubricas do roteiro quanto interpretá-lo à sua maneira. Quase sempre, essas ideias são concretizadas durante ensaios, tanto dos atores quanto da equipe que faz as filmagens e posiciona as luzes.

Foto de David Yates apontando para o alto, pra onde os atores Dan Fogler, Eddie Redmayne e Alison Sudol olham. Eles estão em frente a uma parede verde.

Pelo que podemos ver nos extras do Blu-ray de Animais Fantásticos e Onde Habitam, durante as filmagens dessa série, até mesmo os atores têm liberdade criativa. Ilustrando essa liberdade, pense naquele feitiço em que Newt Scamander levanta sua varinha e a transforma em um guarda-chuva. Aparentemente, ele foi inventado por Eddie Redmayne, intérprete do personagem.

No caso de filmes como os de “Animais Fantásticos”, onde os efeitos visuais são intrínsecos e complexos, as tomadas concluídas e aprovadas são mandadas com antecedência ao departamento de efeitos visuais, que começa a fazer as primeiras renderizações.

Pós-produção

Depois das filmagens serem concluídas, o diretor supervisiona, com a ajuda dos outros dois principais departamentos (fotografia e design de produção), mais algumas etapas. Primeiro, é claro, vem a edição. Aqui, junto com o editor, corta-se o que é considerado excessivo e ajusta-se o ritmo do filme. É a última chance do diretor fazer mudanças no história/roteiro. No fim das contas, é aqui que se decide se o filme passa ou não a mensagem que pretendia passar desde a concepção.

Foto de David Yates sentado em um banco de pedra no cenário de Hogwarts.

David Yates nos bastidores de Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald.

Muitas versões são feitas até que se chegue a uma que seja do agrado do diretor, produtores e estúdio. Se necessário, são marcadas refilmagens, dublagem para cenas em que o áudio não tenha sido captado da melhor maneira, e toda sorte de ajustes. Em grandes filmes, refilmagens são extremamente comuns. Muitas vezes, nesse processo de edição, o editor utiliza trilhas sonoras de outros filmes para poder melhorar os cortes e o ritmo, já que a trilha sonora é o último passo da produção de um filme. Essa trilha, que depois é substituída pela composição original, se chama temp music.

Depois de editado, a atenção do diretor se vira para os efeitos visuais e sonoros. É aqui que são feitos os últimos ajustes e a renderização final dos elementos de CGI, onde são inseridos os sons, e onde são aplicadas correções, tanto ajustivas quanto criativas, às cores, iluminação e lentes. É aqui também que o diretor supervisiona os artistas de foley. Foley é tudo aquilo que você escuta em um filme que não é o diálogo: desde o canto dos passarinhos, passos e respiração, até o barulho dos feitiços, carros e animais.

Por fim, é chegada a hora do diretor sentar e conversar com o responsável pela trilha sonora do filme. Ele explica onde quer uma acentuação musical específica do humor das cenas, ou então como pretende organizar a estrutura de acordo com as composições. É comum que alguns diretores, depois da trilha sonora composta, gravada e masterizada, levem o filme de volta ao editor para que alguns ajustes de ritmo sejam feitos, para aí sim chegar ao produto final.

Raramente, junto com o produtor e o estúdio, o diretor participa das escolhas quanto ao marketing, divulgação e promoção do filme. Ele supervisiona as equipes que fazem os pôsteres, trailers e demais materiais promocionais como seu último respiro sob o filme.

Foto de Yates e Heyman ao lado de vários equipamentos de filmagens numa locação a céu aberto. Os dois riem.

Em grandes franquias como “Animais Fantásticos” e “Harry Potter”, o processo pode ser um pouco diferente do comum relatado acima, já que se sabe que mais filmes virão e que é preciso mantar certa continuidade entre os diferentes projetos, mas o básico está descrito.

Se você quiser deixar algum adendo ou crítica a esse texto, comente abaixo!

Sobre o autor

Igor Moretto

Igor já trabalhou como tradutor de conteúdo em diversos sites. Hoje, formado em Produção Audiovisual, procura alimentar o Animagos com novidades e é responsável pelo Podcast Animagos.