Harry Potter Lembrol

O diário de J.K. Rowling: Parte 1 – Lembrol

Escrito por Igor Moretto

Durante o processo de escrita do último livro da série “Harry Potter”, Harry Potter e as Relíquias da Morte, J.K. Rowling atualizou quase mensalmente a sessão “diário” do seu site oficial. Nas entradas, a autora fala sobre um caderno perdido, reclama sobre a falta de papel, e desabafa sobre falhas nos seus planos.

25 de dezembro de 2005

Tentei fazer um diário muitas vezes e nunca passei do dia 15 de janeiro, mas eu venho sentindo a necessidade de ter um lugar pra poder atualizar o site sem que essas atualizações se qualifiquem como “notícia” de verdade. Como sempre, se eu ficar sumida por um tempo você não precisa achar que eu deixei o diário de lado, e sim que eu estou trabalhando em algo um pouco mais antecipado.

2006 vai ser o ano em que eu vou escrever o último livro da série de “Harry Potter”. Eu contemplo a tarefa com uma mistura de sentimentos de entusiasmo e pavor, porque eu mal posso esperar pra começar a contar a última parte da história e, por fim, responder todas as perguntas (será que eu vou responder todas as perguntas? Vamos focar em responder a maioria delas); e ao mesmo tempo tudo vai acabar e eu não consigo imaginar minha vida sem Harry.

No entanto (limpa a garganta em uma maneira bem britânica) não é hora de ficar emocional.

Estive deixando o planejamento do sete pronto nas últimas semanas pra que eu possa realmente começar a escrever em janeiro. Ler o planejamento é como contemplar o mapa de um país desconhecido ao qual eu vou em breve viajar. As vezes, até mesmo hoje, consigo ver o problema se aproximando; quase todos os seis livros publicados tiveram Capítulos da Destruição. Espero que nenhum supere o Capítulo Que Quase Me Fez Desistir, o capítulo nove de Cálice de Fogo (adequadamente, “A Marca Negra”).

Por enquanto, boas festas pra todos, e se o Papai Noel já desceu a sua chaminé, espero que tenha deixado algo bom.

Divisor de texto

5 de janeiro de 2006

Metas de escrita de fim de ano:

  1. Limpar meu escritório. Meu escritório é facilmente o lugar mais bagunçado da casa, e provavelmente da rua; não vou dizer que é de toda Edimburgo, porque deve ter algum idiota em algum lugar que é pior. Francamente, eu me arrepio toda ao pensar no que vou encontrar quando finalmente chegar no fundo dessas pilhas de lixo. No entanto, como eu estou tendo que fazer um plano de guerra pra chegar a minha mesa, acho que chegou a hora da minha limpeza anual.
  2. Não perder mais cadernos. Depois de algumas semanas em pânico, finalmente encontrei um caderno perdido. Como eu sempre faço quando coloco alguma coisa no lugar errado, eu estava “lembrando”, em sua ausência, que ele continha algumas notas essenciais e ideias muito imaginativas que eu nunca seria capaz de duplicar, e todo o livro seria empobrecido se eu não as encontrasse. Agora que eu tenho esse caderno aqui do meu lado na mesa, no entanto, vejo que tem umas coisinhas legais no meio de um monte de escórias. Pelo menos o estresse que eu passei enquanto achava que o caderno era o equivalente do Santo Graal foi suficiente pra me lembrar que eu tenho que tomar mais cuidado com meu material de trabalho.
  3. Ser muito rígida quanto aos dias de escrita. Não dê o braço a torcer depois de pedidos incessantes para reuniões atrasadíssimas e essenciais. O engraçado é que apesar da escrita já ser minha profissão há muitos anos, parece que eu ainda tenho que sofrer pra arranjar tempo pra escrever. As pessoas parecem não entender que eu tenho que me sentar em paz e escrever os livros, e aparentemente acham que eles vão brotar como cogumelos, sem minha conivência. Eu tenho então que reservar minhas horas de escrita como um Rabo-córneo Húngaro protege seu ovo.
  4. Seguir o conselho dos críticos sobre como ser uma escritora melhor. Eu sempre tento entender críticas construtivas. Quando eu erro, abraço meus erros e os chamo de “estilo”.
  5. Tentar manter as crianças saudáveis. Deixando o inverno mais doente da história dessa família pra trás, rezo para que o nariz de nenhuma das minhas crianças escorra por pelo menos uma semana, pra que eu possa escrever de verdade tido pelo menos algumas horas de sono.

Divisor de texto

25 de janeiro de 2006

Às vezes, a escrita sai tão facilmente que você sente como se estivesse simplesmente transcrevendo o que sua musa inspiradora está ditando. No meu caso, isto acontece com frequência após um período em que não posso escrever, como durante a época natalina (agravada este ano pelos resfriados das crianças mencionados na última anotação do diário). É como se todas as ideias que deveriam ter escapado intermitentemente ao longo das últimas semanas explodissem da minha caneta assim que eu tivesse um tempinho para trabalhar. Normalmente, sou mais produtiva quando tenho, ou tenho tido, tempo reduzido.

É claro, esta situação divina não vai durar muito, nunca dura. Estou destinada a me enrolar em um enredo sem saída ou até ficar encalhada temporariamente na beira de um grande furo na história. Contudo, até lá vou curtir navegar nessa onda de inspiração.

Divisor de texto

28 de fevereiro de 2006

Isto sempre acontece. Faço um planejamento, parece que está tudo lindo e nos conformes, aí vou escrever o livro de verdade e percebo que Harry não conseguiria fazer tudo aquilo em só um capítulo. Então o que eu havia pensado que seriam dois capítulos acabam se tornando quatro. Ainda não acho que o livro será tão longo quanto Ordem da Fênix, mas se isso acontecer mais vezes… não, não vai acontecer. Estou olhando agora para meu planejamento e não vai. Certamente. Por favor.

Não posso mais falar nada no momento. Bem, há MUITA coisa que eu poderia falar neste momento, mas não posso. Perdão.

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5 de abril de 2006

Só me irrito com uma coisa por morar em Edimburgo – bem, duas, mas já aceitei o clima. Por que é tão difícil comprar papel no centro da cidade? O que uma escritora que gosta de escrever elaboradamente vai fazer quando pega o ritmo e percebe, para seu horror, que ela cobriu cada pedacinho de papel em branco da sua bolsa? Levei quarenta e cinco minutos hoje de manhã para encontrar um local que me vendesse papel pautado branco, comum. E há uma universidade aqui! O que os alunos usam? Não me diga “laptops”, faz eu parecer que saí do século XVIII.

O livro está indo bem, sei que está feliz em ouvir isso, no entanto, falta papel. Na semana passada, interrompi a escrita para ir a Londres participar do British Book Awards, também conhecido como “os Nibbies”. Foi bem divertido e empolgante, já que Enigma do Príncipe ganhou prêmio de Livro do Ano. Também aproveitei para visitar Leavesden (o estúdio em que fazem os filmes de “Potter”), coisa que não fazia há séculos por ou estar grávida ou ter bebês pequenos, pelo que pareceu uma eternidade. Foi incrível ver alguns dos novos sets de Ordem da Fênix, mas, principalmente, por ver os atores de novo – ligeiramente inquietante perceber que quase todos eles estão mais altos do que eu agora (falo, é claro, dos adolescentes; Michael Gambon sempre foi mais alto do que eu, e ele estava adorável com seus novos trajes). Fora o prazer de ver Tom Felton, Devon Murray, Alfred Enoch, Sitara Shah (e acenando por trás da porta para Bonnie Wright, que estava ocupada tendo aula), me diverti muito conversando com Dan e Matthew sobre livros, Rupert sobre como suas irmãs nunca o irritam, Oliver e James sobre como é difícil irritar um ao outro, e Emma sobre a vida amorosa de Hermione. Também conheci, e tive uma longa conversa, com Evanna Lynch (Luna), sobre a qual só existe uma coisa a dizer: perfeita.

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Leia a continuação na parte 2 clicando aqui, e veja mais textos históricos traduzidos na nossa página especial do Lembrol!

Sobre o autor

Igor Moretto

Igor já trabalhou como tradutor de conteúdo em diversos sites. Hoje, formado em Produção Audiovisual, procura alimentar o Animagos com novidades e é responsável pelo Podcast Animagos.